11 de febrero de 2009

Ruy Castro sobre Blossom Dearie


Deu ontem na Folha de São Paulo:

RIO DE JANEIRO -- Uma cantora morreu em Nova York
neste fim de semana. Chamava-se Blossom Dearie. Tinha 82 anos e era a última sobrevivente da sua geração de diseuses de cabaré -- intérpretes de pequenos ambientes, especialistas em canções com melodias e letras elaboradas, por autores como Cole Porter, Noël Coward, Duke Ellington, Cy Coleman, Michel Legrand, o próprio Tom Jobim. Canções que "dizem" coisas.

A exemplo de Blossom, esses cantores costumam ser seus próprios pianistas, dando um suave esmalte jazzístico ao acompanhamento. E nenhum deles jamais foi visto num
hit parade. Ao mesmo tempo, atraíram pelos anos afora uma sólida multidinha internacional de adoradores, unidos pela admiração comum. No Brasil, os fãs de Blossom são tão poucos que, pelos meus cálculos, todos devem se conhecer.

Não que ela não pudesse ser de apelo universal. O problema era que o mundo teria de parar para escutá-la -- porque a voz de Blossom, segundo o crítico Whitney Balliett, "mal alcançava o segundo andar de uma casa de bonecas". Já cantava assim, baixinho e sem sombra de vibrato, desde o começo dos anos 50, muito antes que se atribuísse a Chet Baker e João Gilberto a criação desse jeito de cantar.

Depois de décadas na geladeira mesmo nos EUA, as primeiras e definitivas gravações de Blossom estão disponíveis de novo, assim como os discos que ela produziu nos anos 70 e 80 para seu selo Daffodil. Estão todas na Internet. "Hey, John", "I'm hip", "Peel me a grape", "Wave", "Chez moi" e "You fascinate me so" soam melhor do que nunca, vindas do espaço e fazendo curvas entre as esferas.

Em tempos de som e fúria -- cada vez mais difícil dissociar as duas coisas --, Blossom era a prova de que pode haver grande música nas pausas e nos sussurros. Bem a propósito, morreu dormindo.

1 comentario:

Rody dijo...

Ruy Castro sendo bonitinho é nova pra mim. rs.